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terça-feira, 19 de novembro de 2024
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Com nomeações, Bolsonaro age como Exército em fuga que queima pontes e espalha bombas

Por Matheus Pichonelli

Desde o fim das eleições, em outubro, era possível imaginar que até 31 de dezembro o (ainda) presidente Jair Bolsonaro (PL) se comportaria como exército derrotado que foge queimando pontes e plantações para dificultar a vida dos soldados inimigos.

Foi o que, sob a autoridade do capitão, o atual governo promoveu ao anunciar cortes em bolsas e custeio das universidades federais e a extinção de colegiados como a comissão de mortos e desaparecidos políticos.

Na reta final, Bolsonaro tem demonstrado um apego ao cargo que poderia até existir, mas não se via de maneira tão dramática como agora. Esse apego se revela nas lágrimas derramadas em cerimônia dos seus dias finais de mandato.

Dias atrás até a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, desabou: promoveu um cena de novela ao chorar ajoelhada diante de apoiadores em oração.

O desapego não vai ser fácil e essa não é só uma questão de postura.

O desejo de permanência de Bolsonaro se expressa também na força-tarefa para nomear aliados em postos-chave da futura gestão. O exército em retirada não apenas vandaliza o caminho dos adversários como espalha minas terrestres por toda parte.

Em sua boiada final, Bolsonaro nomeou 42 pessoas nesses postos, duas delas para a Comissão de Ética Pública, que tem mandatos de três anos e não podem ser desfeitas.

A Comissão atua como instância consultiva do presidente da República e seus ministros e tem como atribuição administrar a aplicação do Código de Conduta da Alta Administração Federal. Pode ser acionada, por exemplo, sempre que houver dúvidas ou suspeitas de conflito de interesse e condutas em desacordo com a ética profissional do servidor público. A começar pelo presidente.

A comissão é composta por seis membros designados pelo chefe do Executivo e só podem ser substituídos ao fim do mandato ou por renúncia.

Ou seja: aliados de Bolsonaro, os conselheiros nomeados – o atual ministro da Secretaria de Governo, Celso Faria Júnior, e o assessor especial da Presidência, João Henrique Nascimento de Freitas – serão os olhos e os ouvidos do padrinho da nomeação diante de qualquer espirro do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seus ministros. Isso durante três dos quatro anos de mandato.

Não foram as únicas nomeações a toque de caixa. Nesta semana, Bolsonaro encontrou um posto para o seu diretor-geral da Polícia Federal no futuro governo. Márcio Nunes de Oliveira será adido policial na Embaixada do Brasil em Madri pelos próximos três anos.

O presidente determinou também que seu ex-ministro do Turismo, Gilson Machado, será diretor-presidente da Embratur até 2026 e que André Porciúncula ficará na Secretaria de Cultura.

Bolsonaro promoveu nomeações também no Tribunal Superior Eleitoral, no Conselho Nacional de Educação (com quatro nomes escolhidos a dedo), em órgãos diplomáticos e militares e agências reguladoras, como a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).

Aliados do presidente eleito já anunciaram que Lula deve começar seu mandato desfazendo as nomeações e outras decisões tomadas por Bolsonaro em seus últimos dias. Trabalho não faltará.

As únicas nomeações que o petista não poderá revogar são as do Conselho de Ética.

As demais podem ser revertidas assim que o novo governo assumir – o que não deixa de ser um constrangimento e uma fonte de estresse e fricção com os grupos dos quais os escolhidos são representantes, sobretudo os militares.

“Não faz sentido tomar medidas que têm consequências drásticas e futuras de um governo que não vai continuar”, disse ao G1 o deputado eleito Guilherme Boulos (PSOL-SP), integrante da equipe de transição.

Ao menos nesse ponto Lula e Bolsonaro se parecem: assim como o antecessor, o futuro presidente, antes de começar a construir, também pretende desconstruir muita coisa. A começar pelos “presentes” deixados pelo antecessor como herança.

O desejo de permanência denunciado pelas nomeações indica que o bolsonarismo está longe de acabar, formal ou informalmente, após 1º de janeiro de 2023. Fonte: Yahoo. 

Matheus Pichonelli

Sou formado em jornalismo pela Cásper Líbero e em ciências sociais pela USP. Cobri minha primeira eleição em 2006, pela Folha de S.Paulo, e desde então tenho tentado entender (e compartilhar) o impacto das decisões políticas em nossas vidas cotidianas. Pelo Yahoo, acompanhei as eleições de 2014 e 2018. Tenho passagens também pelo portal iG, CartaCapital e UOL, onde mantenho uma coluna sobre comportamento, além de colaborações para veículos como The Intercept Brasil e o jornal O Globo.

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